Capítulo V
Subiram para uma
motinha amarelada, já um pouco antiga e muito usada, mas muito útil, naquela
cidade enorme e de trânsito caótico. Pietro levantou o assento ergonómico
retirando dois capacetes e colocou um deles, com desenhos de asas, num fundo
azul-bebé, parecendo homenagear os afrescos que tinham acabado de observar
juntos, passando-lhe para as mãos um de cor rosada. Maria segurou no capacete
entre as mãos, hesitante, e o rapaz, ao perceber a sua dúvida soltou
rapidamente. “É da minha irmã, costumo levá-la ao trabalho.” Justificou-se,
ajudando-a a colocá-lo e apertando-o de forma suave. Maria retirou os cabelos
que tinham ficado presos dentro do capacete e fitou o rapaz que a olhava
sorrindo, retribuindo-o. Subiram e Pietro arrancou com toda a força enquanto
Maria, atrás, se agarrava cada vez com mais força. Primeiro timidamente, com
medo de fazer demasiada força, depois com vontade, com medo de ser projetada
pelas curvas e contracurvas daquela motoreta que virava à esquerda e à direita,
numa sucessão de reviravoltas confusas e incoerentes, em que todos os edifícios
pareciam iguais e todas as estátuas pareciam feitas pelo mesmo artista. Não
fazia a mínima ideia de onde estava e nem sequer se preocupava. Estava pronta
para descobrir aquele novo mundo com todas as suas forças.
Pararam numa
praça, La Piazza Navonna ,
bela, rodeada de edifícios gigantes, onde se destacava o palácio Pamphilj, sede
da Embaixada do Brasil, talvez por Maria ter reconhecido imediatamente a
bandeira canarinha. No centro, inúmeros turistas fotografavam a família ou os
amigos em poses algo ridículas, frente a uma fonte onde se destacavam quatro
enormes seres, com figuras de homens, entre rochas, rodeando um obelisco,
símbolo máximo do poder e virilidade do império romano, importado do Antigo
Egito. “La Fontana Quattro Fiumi, A fonte do quatro rios.” Apontou
Pietro, depois de descerem ambos da mota, enquanto guardava distraidamente os
capacetes no local de onde os retirara e Maria desviava os cachos que lhe
tinham escapado para a frente dos olhos curiosos. “Quatro rios? Parecem quatro
homens, no máximo quatro Deuses.” Aproximavam-se lentamente do centro da praça,
procurando ver com mais pormenor a fonte. “Pietro começou a explicação. As
figuras semelhantes a humanos na verdade simbolizam os quatro grandes rios
conhecidos na altura, que por sua vez simbolizavam os quatro grandes
continentes conhecidos.” Tinham chegado junto à fonte e Maria conseguia agora
observar a delicadeza de traços de cada uma das figuras, num contraste um pouco
brutal com a rudeza das pedras onde estas estavam pousadas. Conseguia
perceber-se cada músculo, cada ligamento dos supostos rios, de tal modo que
pareciam pessoas verdadeiras cobertas por uma fina camada de pó de pedra, tal
era o realismo. “Este é o grande Nilo, de África,” apontava para um deles,
“aquele é o rio Ganges, asiático e os do outro lado são o Rio da Prata na
América e o Danúbio, na Europa.” “É impressionante!” Escapou-se dos lábios da
rapariga que olhava atentamente cada detalhe enquanto ia deslizando à volta da
fonte, seguida de perto pelo seu guia privado. “Pois é, foi esculpida Bernini,
o mesmo que fez o baldaquino da Basílica de São Pedro.” Maria, tão submersa no
banho de arte que tomava, acabava por se alhear do resto à sua volta e deixar
escapar os pensamentos que, em qualquer outra situação, manteria secretos, bem
lá no fundo da alma. “Estava a falar de ti.” Sentiu-se ruborizar e, de
imediato, como que acometida por um choque de realidade, resolveu emendar
enquanto Pietro sorria, naquele sorriso aberto e agradável de quem nada teme e
nada esconde. “O que eu quero dizer é que sabes tudo sobre a história do teu
país, da tua cultura. Percebes?” Fez uma pequena pausa procurando organizar as
palavras de que precisava para se fazer entender. “Se isto acontecesse em
Portugal, não saberia explicar-te nada deste género. Nada sobre a minha
cultura. O máximo que poderia fazer era levar-te a um shopping para te mostrar
lojas de marcas americanas ou a uma qualquer loja asiática, com milhões de
pechinchas para recordações…” Pietro soltou uma sonora gargalhada. “Ah, eu sou
uma pessoas suspeita para falar destas coisas. A coisa mais importante da minha
vida é estudar os grandes artistas. E fiz montes de trabalhos sobre estas obras
durante o meu curso. Cada um tem mais inclinação para um determinando assunto.”
E virando-se para ela. “Tu, por exemplo, o que é que te apaixona? O que é que
te faz falar sem teres noção de que está na hora de parar… O que te faz
capturar uma turista que encontras num museu e desatar a falar sem lhe dar
tempo para respirar?” Agora riam-se em conjunto, enquanto se iam afastando da
famosa fonte. “Pois,” hesitou, “Não sei. Nunca me apaixonei assim por nada…”
Encolheu os ombros e ambos permaneceram calados durante breves minutos até que
Maria recomeçou. “Por acaso, há uma coisa que não me sai da cabeça há um
bocado…” Perante a expressão curiosa do rapaz, disparou. “O que é um
badalquino?”
***
As horas iam passando enquanto os dois
jovens, sentados num banco de pedra, iam saboreando um gigantesco donuts, como
Maria lhe chamou, gulosamente barrado de creme de chocolate e o romano lhe
explicava que badalquino era o que tapava o papa e o seu altar, no interior da
basílica, que Maria não chegara a ver devido ao doce rapto que vivera, até que resolveram
deixar a bela praça e voltar cada um para o seu ritmo. Quando deu por si viu-se
a sair da mota e acenar ao condutor, já à porta do seu refúgio, retribuindo o
seu sorriso. Estava na hora de decidir o que fazer da sua vida.
E a despedida? Subtil? Sublime? Nervosa? O suspanse mantém-se!!!! Um beijinho
ResponderEliminarEntao , e depois o que e que aconteceu ? Will they get together again? Can't wait... Xx sonia
ResponderEliminarE agora.....quero já o proximo para ler por favor.......
ResponderEliminarCaras companheiras de viagem... a história fica cada vez mais emocionante e eu até vos poderia dizer o que vai acontecer a seguir... Bem, poder, eu podia... Mas não era a mesma coisa... Continuem nesta aventura e ... Boa viagem
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